Uma vez, uma amiga enviou-me um Koan. Simplesmente!
Dizia apenas que eu estaria pendurado numa corda estendida sobre um precipício e que, em uma extremidade havia um rato branco e na outra um rato negro, que poderiam roer a corda.
Parece-me que o koan por inteiro é ligeiramente mais complexo do que isso, mas não vem ao caso porque só posteriormente fiquei sabendo dele por completo.
Não houve inquirições ou pedidos de comentários.
Antes de tudo: O que é um Koan?
Um Koan é uma pequena história ou frase, que não pretende permitir análises, antes o objetivo é contrapor-e à racionalidade, ao pensamento construído sobre a lógica. O Koan é um ponto de partida para abrir a mente e servir de guia pelo longo caminho da conscientização.
Então, por que analisá-lo?
É que eu sou Engenheiro, e imaginar-se numa corda no meio de um precipício e com 2 ratos nas pontas pode proporcionar análises realmente muito interessantes, tenha essa análise um caráter zen ou puramente filosófico ocidental, ou ainda somente pessoal.
A corda para mim simboliza a vida na qual sempre podemos decidir entre 2 alternativas (isso quando a vida é boazinha conosco), mas nunca saberemos o que teria acontecido caso tivessemos escolhido a outra.
E porque tal como a vida, escolher um lado não significa ir para frente ou para trás mas simplesmente para um destino.
E também, do mesmo modo que a vida, basta um gesto, apenas um abrir das mãos para deixá-la.
O rato branco ou o rato preto poderiam ter qualquer conotação (bem e mal, verdade e mentira, luz e escuridão, etc...) eu prefiro simplesmente pensá-los como alternativas "a" e "b" visto que o branco e o preto não podem intrinsecamente simbolizar nada mais do que isso.
E também porque os ratos qualquer que seja sua cor, raça, credo, ou time do coração, não teriam qualquer compromisso com o ser pendurado na corda e somente com sua própria vontade de roer ou não roer a corda.
É interessante pensar que na situação tratada: o ser humano no meio da sua vida, tendo duas escolhas possíveis a fazer, vê-se numa situação em que não é dono do próprio destino. Primeiro precisa tomar a decisão de ir para o lado "a" ou "b". Mas não sabe se fará a escolha certa porque não está enxergando nada além de seus dois possíveis algozes e portanto não poderá decidir com base em uma perspectiva de futuro. Por outro lado mesmo que decida ir para o lado do rato que não roerá a corda, continua correndo risco porque se o outro rato roe-la o equilíbrio de forças se romperá e ele (o ser humano) será lançado contra a parede de rochas mesmo tendo feito a escolha certa.
Restaria a ele não decidir?
Não, de forma alguma! A vida é sempre uma sequência de decisões e até mesmo ficar parado esperando que seu esgotamento o faça soltar a corda terá sido uma decisão.
O mais interessante disso é que mesmo que o tal humano seja um santo e que o seu destino final seja o paraíso, ele não o encontrará antes de ter descido ao abismo ou ido de encontro às rochas e em ambos os casos encontrará a dor antes do paraíso. Eu acho essa a parte mais intrigante! Não teremos nós o direito ao paraíso sem experimentar a dor?
Saia do lugar
Então eu penso que a decisão a ser tomada é começar imediatamente a caminhada para um dos lados olhando fixamente para os olhos do rato e concentrando todas as suas energias mentais nesse olhar de modo a paralizar o rato que então não roerá a corda (se você leitor não acreditava em forças mentais, taí um bom momento pra começar o exercício). Quanto mais perto estivermos do rato, maior será a nossa influência sobre a vontade dele que ficará imobilizado ou terminará fugindo, deixando o nosso caminho livre.
Isso faz sentido porque o impacto contra as rochas será tão menor quanto mais na extremidade sustentada da corda o ser humano estiver. Em outras palavras, quanto mais próximo do ponto “a” menor será o choque contra as rochas se o rato da extremidade “b” (às suas costas) roe-la.
Porém, torna-o mais vulnerável se o rato à sua frente roe-la(esse é o risco da decisão), daí a necessidade de dominá-lo, paralisa-lo com o olhar.
E por último, não podemos nos esquecer de usar parcimoniosamente nossa força procurando enlaçar nossas pernas na corda de modo a distribuir melhor o nosso peso entre os quatro membros. Com isso ficaremos abraçados de corpo inteiro na corda que é o modo correto de lidar com a vida. Devemos sempre abraça-la de corpo inteiro mesmo que mal suportemos o nosso próprio peso.
É isso leitores! Gostaria de saber se concordam ou não com minhas filosofadas insônes!
Adendo:
Vi uma entrevista com um monge tibetano que falou algumas coisas geniais. Ele falava sobre a necessidade de nos desapegarmos das coisas materiais porque isso não significará necessariamente perdas. Ao contrário ao desapegarmos poderemos manter, isso dependendo da forma como agimos.
Ele deu o exemplo com uma moeda. Coloque uma de suas mãos com a palma para baixo. Agora coloque uma moeda na palma dessa mão e a feche. Você terá a moeda com você. Agora abra a mão. A moeda cairá, isto é, fugirá de você. Repita o processo agora com a palma da mão voltada para cima. Você manterá a moeda enquanto estiver agarrando-a (é obvio!) Mas se você se desapegar e abrir a mão a moeda continuará lá, sendo sua embora você não a agarre!
Não é intrigante?
16 fevereiro 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
5 comentários:
outro koan pra você "analisar": "Batendo duas mãos uma na outra temos um som; qual é o som de uma mão?"
Essa é punk! Precisarei ouvir antes o som das asas das borboletas, mas eu chego lá! Como toda boa adepta do zen eu espero que você não tenha muita pressa!
e nem faria mesmo sentido ter pressa mas, se depois de alguns anos, como no outro koan, você quiser comentar, não deixe de me avisar! :-) gashô!
Um Koan podemos tentar explicá-lo e encontrarmos uma saída daquilo que parece ser obvio demais à uma mente bem treinada, podemos também encontrar sua “solução”, mas se analisarmos o koan do ponto de vista de quem esta na corda e não de quem esta olhando pra alguém na corda, encontraremos o verdadeiro sentido dele... Por diversas vezes nos pegamos vendo uma situação analisando de fora e dizendo, poxa, mas estava na cara ele deveria ter feito isso, aquilo e depois aquilo outro, mas viver é sentir, sabemos que não temos como realmente saber o que faríamos a não ser estando na situação. Tentemos enxergar a situação em toda sua totalidade e subjetividade, é fácil sermos objetivos olhando de fora, mas quando se esta imerso numa situação a subjetividade impera, voltemos a nossa tentativa de elucidar o Koan pensemos a principio, apenas nos ratos, pode haver um preconceito quanto à cor, ou achar que um é mais selvagem do que o outro e o fará roer mais rápido, ou o angulo de determinado rato e sua mordida, se um se distrai mais do q o outro, sem exagero podemos citar centenas de características, combinações e situações entre elas q nos faria tomar uma atitude racional e "logica" para q lado devemos ir, sem contar outros fatores, como textura da corda, vento, os diferentes paredões onde um pode se mais doloroso do q o outro, também temos que levar em conta aspectos subjetivos como auto estima, capacidade de lidar com os medos e problemas, bilhões de combinações.... Isso faz q cada koan atinja cada mente de uma maneira diferente... Tornando sua explicação lógica uma tentativa superficial, ela pode até mostrar uma verdade, mas essa verdade pertence só a você e a ninguém mais. Essa é a grande beleza de um koan.
Esse koan é maravilhoso, se pensarmos como você, sendo a corda uma metáfora da vida, no final da vida sempre há um paredão, a maneira como vc resolveu viver a vida (corda), ficando parado, resignado melancólico pelo fim inevitável, ou fez sua escolha, e busca, tendo toda a experiência vivida ao escolher pra onde que ir, ou depois tendo escolhido o lado “errado” e pensar na sua vida se você tivesse feito outras escolhas, podemos discorrer tb sobre dezenas de tipos de experiência, de observação, de sentido, de busca... Essa é vida, de cada um, com a beleza implícita de cada experiência que nos faz seres únicos dentro do nosso próprio universo. Mas, ninguém tem q concordar, e esse por si só já é um grande koan...
Nao ensinar è uma agressao, mas te privar da experiencia è um crime maior...
Namaste
Muito bem, jovem padawan!
estás seguindo muito bem o caminho da iluminação.
Um grande abraço!
Postar um comentário